A atriz Yohama Eshima, 34, usou as redes sociais na sexta-feira (14) para expor uma situação difícil envolvendo o filho dela, Tom, de quase 3 anos. O garoto tem esclerose tuberosa, uma doença crônica e degenerativa que pode causar epilepsia, e, por isso, necessita de um medicamento diário para controlar as crises.
De acordo com Yohama, na manhã de sexta, ela descobriu após o relato de outras mães que alguns lotes da medicação Sabril (à base do fármaco vigabatrina) estariam contaminados pela substância tiaprida, usada principalmente para tratar a abstinência de álcool.
"Sigo uma rede de mães de crianças atípicas e, hoje cedo, vi posts no Instagram de uma delas desabafando que a filha tinha tomado o remédio contaminado por dois dias e estava mais sonolenta", explicou a VivaBem.
A Sanofi, laboratório que produz o Sabril, confirmou a informação à reportagem e disse que iniciou o recolhimentos de quatro lotes em 10 de julho. O remédio também é usado por crianças com a síndrome de West, condição epiléptica rara. Em nota, a farmacêutica afirma que "identificou traços de tiaprida" na matéria-prima do Sabril em quantidades abaixo da dose máxima diária recomendada. No Brasil, a tiaprida não é liberada para crianças.
A Sanofi optou pelo recolhimento preventivo e voluntário de todos os lotes impactados, devido ao fato de não existirem estudos sobre o efeito de tiaprida na população pediátrica. Nota da Sanofi, laboratório que produz o Sabril
Quais os lotes contaminados?
A Sanofi informou que os lotes de Sabril em recolhimento são:
- CRA02747, com validade até 30/04/2024;
- CRA06696R, com validade até 31/08/2024;
- DRA00489V, com validade até 31/01/2025;
- DRA00490, com validade até 31/01/2025.
Yohama, que atuou na novela "Travessia", da TV Globo, disse que uma amiga que é mãe e mora em Santa Catarina foi contatada pelo SUS do estado e só por isso sabia do ocorrido. Yohama pediu, então, os números dos lotes.
Descobri que meu filho estava tomando um dos lotes contaminados há 2 meses. Mas não sei se durou mais tempo. Yohama Eshima
Na sequência, a atriz ligou para o telefone disponível na caixa do remédio e teve a confirmação. "Eles confirmaram os lotes que essa mãe postou. Me pediram para interromper o uso e fazer a devolução", explica. A atriz tinha comprado uma das caixas na farmácia e, com isso, vai conseguir o reembolso —a outra foi obtida pelo SUS.
Yohama contou ainda que não encontra locais que estejam vendendo a medicação sem ser dos lotes contaminados. "Meu filho deve ficar sem medicação hoje", disse. A farmacêutica diz tomar "medidas necessárias" para minimizar os impactos ao abastecimento do produto.
O que fazer em caso de contaminação?
Informe o médico que acompanha o paciente, que irá indicar como o tratamento deve seguir.
A Sanofi orienta contatar o SAC (Serviço de Atendimento ao Consumidor), disponível pelo telefone 0800 703 0014 (de segunda a sexta-feira das 8h00 às 18h00) e pelo e-mail sac.brasil@sanofi.com.
Quais os riscos
Yohama notou alterações em Tom, mas não sabe se isso tem relação com a medicação modificada. "Meu filho está bem, mas tinha percebido algumas mudanças no comportamento. Ele está mais sonolento. Mas não posso afirmar que é por causa da contaminação, porque ele tem epilepsia e a própria doença o deixa mais sonolento", diz.
A vigabatrina, substância do Sabril, reduz as atividades elétricas cerebrais que causam a convulsão, explica Graciliano Ramos, professor de farmacologia da Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas. Ela atua nos receptores do neurotransmissor gaba, o sistema gabaminérgico.
Já a tiaprida, age em outro sistema cerebral, o dopaminérgico. A dopamina é uma via cerebral relacionada à excitação. Pessoas em abstinência, por exemplo, têm uma elevação natural, e a tiaprida bloqueia a dopamina, diminuindo a compulsão pelo álcool. Seu tipo de ação é chamado neuroléptico, ou antipsicótico, porque causa rebaixamento da atividade cerebral.
"A depender da dose [de tiaprida], é como pisar no freio de um carro em alta velocidade e ir para 0 quilômetro por hora, quando tudo para de uma vez, ou ter a sensação de que as coisas estão em slow motion, como se o mundo trabalhasse em câmera lenta", descreve Ramos, doutor em saúde materno infantil pelo Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (PE).
Essa ação explica os principais sintomas imediatos da medicação, como sonolência e prostração, diz Ramos. Eventuais efeitos a longo prazo são mais difíceis de serem relacionados, porque dependem da dose e das características farmacogenéticas de cada pessoa —como a natureza genética dela responde à substância.
Eu considero perigosa a presença de tiaprida de forma não intencional na medicação, porque o médico não sabe que ela está entrando no tratamento e causa rebaixamento do nível de consciência, que, a depender da faixa etária e da dose, pode ser preocupante e com repercussões maiores. Graciliano Ramos, professor de farmacologia
A Sanofi reiterou que a quantidade de tiaprida está abaixo da dose máxima diária, mas afirmou que não pode descartar os riscos de bula do fármaco (como sonolência, mudanças de comportamento, tremores e dificuldades de movimento), além de não existirem estudos robustos em crianças.
Desrespeito
Yohama classifica a situação como um desrespeito às famílias atípicas. "As pessoas com deficiência parecem sempre ser deixadas de lado. A sensação que dá é de um completo descaso. Ninguém avisou nada para nós", desabafa.
Quando vi que as duas caixas de remédios estavam entre os lotes contaminados, comecei a chorar e tremer de raiva. A gente já tem tanta dificuldade com as próprias crises convulsivas, o preconceito. Isso é mais uma coisa que pesa no nosso trabalho como mães e pais de uma criança com deficiência. Yohama Eshima
Filho de atriz usou remédio contaminado por 2 meses; laboratório confirma - VivaBem
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