Em São Gabriel da Cachoeira (AM), município que abriga a maior população indígena do Brasil, a cientista política Dadá do Povo Baniwa descobriu, aos 35 anos, que estava na menopausa.
"Eu já tinha lido sobre isso e colegas indígenas também me falaram, mas achei estranho por causa da idade", lembra ela, hoje aos 42. "Graças a Deus não tenho sintomas".
Em Cajamar (SP), a auxiliar de limpeza Antonia Ferreira Seabra, 51, espera entender o que está vivendo. A cada dia "o corpo fica pegando fogo", descreve.
"Eu sinto muito calor, até no frio. Às vezes você está no meio das pessoas e começa a suar, suar, suar e, como tenho a pele escura, fica aquele suor escorrendo. Dá até vergonha. Tenho que andar sempre com uma toalhinha e uma garrafa d’água. Fico irritada com facilidade e tenho dor de cabeça."
Antonia não menstruava há cerca de um ano quando percebeu que a irmã vivia calores parecidos. Ao ouvir dela e de outras mulheres "é menopausa", entendeu que o momento havia chegado. Espera agora sua consulta pelo SUS (Sistema Único de Saúde). "Na minha opinião, muitas mulheres chegam a essa fase sem ter conhecimento do que está acontecendo com o próprio corpo", diz.
Definida como a parada definitiva da menstruação, a menopausa chega às mulheres sem que muitas delas tenham informação suficiente para viver o período. A maioria tem pouca ou nenhuma instrução sobre os sintomas, segundo especialista. Ela é considerada normal acima dos 40 anos. Estudos recentes mostram a idade média no Brasil como 46. Mas ela também pode ser precoce.
As razões são diversas ou, em alguns casos, incógnitas. O que se sabe é que mais cedo ou mais tarde, todas as mulheres vivem essa jornada e que muitas entram nela desinformada, aponta Lúcia Costa Paiva, professora titular de ginecologia da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e coordenadora do Ambulatório de Menopausa da universidade.
Pesquisadora da área há mais de 30 anos, Paiva não vê diferenças significativas desde que começou a estudar o assunto. Ela diz que as mulheres seguem entrando no período saber o que sentem e o que vão enfrentar.
"Hoje as mulheres trocam mais informação, mas é muito menos do que gostaríamos", pontua, ao complementar que esse desconhecimento traz, como principais consequências, "passar pela menopausa de forma muito mais difícil, com menos qualidade de vida".
A menopausa ocorre com o envelhecimento dos ovários, indica a professora. Eles param de funcionar, deixam de produzir hormônios e, assim, há o fim da vida reprodutiva da mulher. O processo gera sintomas, como calor, sudorese, problemas com o sono, irritabilidade, humor depressivo e problemas vaginais, tal qual ressecamento, dor em relações sexuais e atrofia da mucosa da região.
Paiva diz que o tratamento adequado melhora tais manifestações e previne doenças cardiovasculares, além da osteoporose.
O ambulatório que coordena recebe de 40 a 50 casos por dia, com pacientes que chegam ao local com fortes sintomas e questões psicológicas, encaminhadas por postos de saúde ou hospitais da instituição.
"Nas nossas pesquisas identificamos que escolaridade baixa e nível socioeconômico baixo são agravantes para o desconhecimento das questões da menopausa. Mas mesmo entre as mulheres mais escolarizadas há bastante desconhecimento sobre sintomas", observa.
Mulheres indígenas estão entre as que chegam à menopausa com poucas instruções, diz Dadá do Povo Baniwa. Para ela, o saber sobre o assunto é cultural.
"Não são orientações do médico ou alguém da área de saúde, e essa falta é uma coisa ruim, porque nós também temos nossos direitos e devemos ter um atendimento de saúde diferenciado", aponta. "Na aldeia, na maioria das vezes, quem dá esse diagnóstico são as mulheres mais idosas. Recomendam usar chás, remédios caseiros para amenizar os sintomas."
Mas a falta de informações e a surpresa no diagnóstico não atingem só esses territórios. A terapeuta holística Patrícia Lopes estava em um consultório no Rio de Janeiro quando ouviu, aos 39 anos, que está na menopausa. Em meio a exames ginecológicos de rotina, recebeu a notícia –descoberta que ocorreu mais de um ano depois de perceber a menstruação irregular, muita fadiga, fraqueza muscular e queda brusca na libido, entre outros sintomas.
"Nunca imaginei que seria isso. Pensei em problemas com tireóide, disfunção hormonal temporária, mas nunca menopausa. Eu fiquei péssima. Ainda estou em processo de aceitação. Sempre achei que a menopausa era para pessoas depois dos 50", diz. "Eu pensei ‘minha vida como mulher acabou'. E senti muita vontade de chorar".
Em uma cultura em que os valores estão concentrados na beleza e juventude, mulheres evitam falar sobre menopausa por vergonha, como um carimbo de envelhecimento, diz a professora Lúcia Costa Paiva.
"Não se conversa muito sobre isso. Existe tabu de falar sobre menopausa, do que representa, então as mulheres chegam com falta de informação", acrescenta, ressaltando que os médicos também precisam receber mais treinamento para atender essas pacientes. Elas se queixam de que muitos não ouvem-nas.
Paiva também chama a atenção para a falta de tratamento hormonal no SUS, uma das opções terapêuticas. Na farmácia, o custo varia de R$ 40 a R$ 120, indica a professora. O preço cobrado é um aperto para Antonia. "Seria difícil, porque ganho pouco, pago aluguel, sou pai e mãe, sustento a casa. Eu teria que fazer um sacrifício para comprar. Teria que abrir mão de alguma outra coisa, até mesmo de um alimento", diz a auxiliar de limpeza.
Nessa história de menopausa, ela só gostou de não menstruar mais. Dadá também diz sentir um alívio. Frisa, porém, que o período para ela, enquanto indígena, "é de desafio, mas também de ajudar a outras mulheres".
Menopausa é desconhecida por mulheres, que não sabem lidar com os sintomas - UOL
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