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Tuesday, December 13, 2022

Nova onda de covid-19 pode ter recorde de infectados - VivaBem

Estudos científicos confirmam que o coronavírus vem se tornando mais transmissível e tem mantido sua letalidade, sendo que as vacinas são as únicas responsáveis por diminuir o número de internações e óbitos a cada onda de covid-19 que vimos durante a pandemia.

Nas últimas semanas, temos observado um novo aumento expressivo de casos, internações e até óbitos pela doença no Brasil —isso tudo em meio a um apagão de dados sobre a doença, propiciado pelo Ministério da Saúde.

A situação é tão séria que mal sabemos a quantidade de vacinas que o Brasil dispõe neste momento e o prazo de validade delas. Outro blackout é sobre os próprios dados da doença, em que modelos epidemiológicos publicados em periódicos científicos apontaram que, em alguns meses de 2022, as mortes provocadas pela covid-19 foram subnotificadas e o número real de óbitos pode ser até oito vezes maior do que o informado —o que demonstra que a situação que o Brasil enfrenta neste momento é muito mais grave que a resposta que o governo tem dado.

Em 07 de agosto de 2020, eu e colaboradores publicamos um artigo na Nature Medicine alertando que Manaus passaria por uma segunda onda de covid-19. Parte da população e tomadores de decisão ignoraram completamente os alertas, o que conduziu ao colapso do sistema de saúde e funerário da cidade, produzindo uma das maiores catástrofes de saúde pública já vistas no Brasil (que poderia ter sido evitada).

Na ocasião, nossos estudos estavam embasados em modelos epidemiológicos conhecidos como SEIR (Susceptíveis - Expostos - Infectados e Removidos). Estes modelos são uma ferramenta padrão em epidemiologia e muito úteis para prever com exatidão as dinâmicas epidemiológicas de uma epidemia ou pandemia com antecedência, para tomada de decisão em tempo hábil.

  • Estudos utilizando essa metodologia foram capazes de alertar sobre todas as grandes ondas no Brasil, que poderiam ter sido evitadas ou pelo menos mitigadas se não fosse a ausência de ação do Governo Federal e de governos estaduais.

Um artigo científico publicado no Journal of Public Health Policy chegou a demonstrar que, em 2021, o Brasil se tornou o epicentro global da pandemia de covid-19 devido à ausência de políticas de saúde e a demora para vacinar a população. Quando a cobertura vacinal foi ampliada, houve uma queda drástica do número de infectados, internações e óbitos no país.

Se temos vacinas, por que pode haver outro tsunami de covid, capaz de levar a um novo colapso no sistema de saúde?

A resposta está em um artigo científico publicado no The New England Journal of Medicine:

  • Novas variantes do SARS-CoV-2 (como a ômicron BA.4, BA.5, BA.4.6 e BQ1) escapam dos anticorpos produzidos pelas vacinas ou pelo contato natural com o vírus. Logo, as vacinas hoje aplicadas na população brasileira não possuem a mesma eficácia contra essas novas variantes, como tinham contra as variantes mais basais que circularam ano passado.
  • A variante ômicron BA.4.6 apresenta um escape da proteção das vacinas que supera em 71 vezes o escape de neutralização observado no coronavírus "original", que deu início à pandemia.
  • O governo federal novamente demora para adquirir vacinas, como o novo imunizante bivalente já aprovado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), mais eficaz contra as novas variantes ômicron BA.4 e ômicron BA.5.
  • Na última sexta-feira (9), o Brasil recebeu um lote de vacinas bivalentes que têm maior proteção contra a variante ômicron original e a variante BA.1, ambas as variantes não são mais predominantes no país, o que demonstra um atraso em adquirir vacinas mais eficazes contra as variantes predominantes.

Mesmo sem as novas vacinas, pessoas que já tomaram a primeira e segunda doses mais duas doses reforço possuem menor propensão a desenvolver as formas graves da covid-19, que demandam de internação e podem levar à morte. Porém, não podemos ter certeza de que a população estará protegida nesta nova onda por dois motivos:

  1. A maioria nem completou o esquema vacinal com doses de reforço.
  2. Agora deixamos de usar máscaras e o índice de mobilidade urbana é maior que nos anos anteriores.

Se nenhuma nova medida for adotada, esses fatores devem inflar substancialmente a transmissão comunitária do coronavírus em limiares nunca vistos antes no Brasil, causando um tsunami de casos e, consequentemente, internações e mortes

Esse novo aumento da covid-19 no Brasil já foi suficiente para termos que adotar novamente o uso obrigatório de máscaras em voos e aeroportos, entretanto, boa parte da população continua dispensando o acessório fundamental para proteção individual, em um momento de alta transmissão comunitária que deve se intensificar com as festas de final de ano.

  • Máscaras podem reduzir em até 70% a emissão de partículas virais emitidas por um individuo infectado, além de filtrar estas partículas suspensas no ar, diminuindo substancialmente o risco de pessoas saudáveis se contaminarem ao usar o acessório.

Desta forma, com a obrigatoriedade de máscaras, a proteção é dupla, tanto para impedir a propagação do coronavírus em ambientes fechados, como para bloquear a inalação de partículas virais por indivíduos saudáveis, evitando novas infecções.

Estudo desenvolvido em Manaus, um dos epicentros da pandemia no país, demonstrou que uma pessoa pode contrair a covid-19 suscetíveis vezes, apresentando agravo a cada reinfecção.

Além disso, estudos apontam para uma queda de imunidade individual após um período médio de 240 dias, o que é preocupante, dado que o Brasil reduziu expressivamente as taxas de vacinação nos últimos seis meses, o que coloca o país em uma janela de queda vacinal que se alinha a uma janela de perda de imunidade da população.

Outros locais, como os estados da Califórnia e Nova York, nos Estados Unidos, já mostram um maior número de internações nesse momento do que nas últimas três ondas de covid-19, o que indica maior taxa de transmissão do coronavírus. Portanto, o Brasil deve esperar novamente um grande número de internações.

O Centro de Prevenção de Controle de Doenças dos Estados Unidos já recomendou o uso obrigatório de máscaras para conter o novo avanço da covid no país. Voltar a obrigar a utilização de máscaras em locais públicos pode ser uma medida impopular, mas ou tomamos essa medida imediatamente ou teremos que adotar medidas mais austeras em médio prazo, como um novo isolamento social, para evitar o colapso do sistema de saúde.

É de interesse da organização nacional das indústrias e do comércio adotar medidas para que não cheguemos a necessitar de novas restrições, e a obrigatoriedade de máscaras deve ser apoiada.

  • Estados e municípios devem preparar o sistema público de saúde para suportar internações em proporção equivalente à primeira onda de covid-19, de acordo com resultados apontados por modelos epidemiológicos do tipo SEIR.

Como falei, as novas variantes burlam parte da proteção conferida pelas vacinas e outras medidas são necessárias imediatamente. Estamos produzindo a mesma receita que gerou a catástrofe que observamos em 2020 e 2021 ao negar ou ignorar a gravidade da pandemia de covid-19. Nesse momento, os modelos epidemiológicos são claros, já vivemos o início de outra grande onda.

*Lucas Ferrante é biólogo, formado pela Unifal (Universidade Federal de Alfenas), mestre e doutor em biologia pelo Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia). Durante a pandemia, tem coordenado o grupo multidisciplinar envolvendo pesquisadores do INPA, UFAM, UFMG e UFSJ, que avalia o risco pandêmico de vários municípios do Brasil por meio de modelos epidemiológicos do tipo SEIR (Susceptíveis - Expostos - Infectados - Recuperados).

*Lucas Ferrante é biólogo, formado pela Universidade Federal de Alfenas (Unifal), mestre e doutor em Biologia (Ecologia) pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa). Entre suas diversas linhas de pesquisa, tem pesquisado o impacto de plantações de biocombustíveis sobre a estrutura de florestas, da biodiversidade e de serviços ecossistêmicos, sendo o pesquisador responsável pela denuncia e pelo embasamento da ação que derrubou o decreto que liberava o plantio de cana-de-açúcar na Amazônia e no Pantanal

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