O patologista clínico e empresário Mário Flávio Leme Paes e Alcântara, 87, já lutava havia 13 anos contra um câncer de próstata quando realizou um amplo teste genômico no tumor. Por meio do exame, os médicos descobriram uma alteração genética rara e viram que a imunoterapia poderia ser eficaz para combater o avanço da doença.
Na época que iniciou o tratamento, Mário tinha 83 anos e o tumor já tinha se espalhado para outros órgãos. Após dez aplicações, ele se curou do câncer metastático. A seguir, conheça a história dele:
"Em 2005, aos 70 anos, tive o primeiro sinal do câncer de próstata que se manifestou com uma dificuldade e um grande esforço para urinar. Procurei um urologista e fiz alguns exames, entre eles o exame de toque, ultrassom e PSA. Os resultados apontaram um aumento da próstata.
O médico disse que essa alteração poderia ser duas coisas: o crescimento natural da próstata que ocorre na maioria dos homens conforme o envelhecimento ou um câncer de próstata. Fui submetido a uma biópsia e foi confirmado o tumor maligno em estágio inicial.
Apesar do susto, me mantive tranquilo e otimista de que iria ficar bem. Passei a tomar uma medicação oral diária, fiz uma sessão de braquiterapia, onde foram colocadas sementes (implantes radioativos) dentro da próstata, e algumas sessões de radioterapia. O tratamento surtiu efeito e fiquei estável por oito anos.
Em 2013, voltei a ter dificuldade para urinar e procurei novamente o urologista. Uma nova biópsia constatou o retorno da doença em nível mais avançado. Fiz uma cirurgia de retirada total da próstata.
Em 2017, aos 82, apresentei metástase dentro da cavidade abdominal e fui submetido a uma cirurgia de salvamento. Neste procedimento, retirei todo o abdome, o reto, a bexiga e um dos ureteres que estavam comprometidos. Por conta disso, passei a usar bolsa de colostomia.
Apesar de todas as intervenções e procedimentos, um ano depois tive uma piora. A tomografia mostrou o retorno da doença e o aumento dos níveis do PSA. Diante deste cenário, o oncologista sugeriu que eu fizesse um teste genômico no tumor que buscaria por alterações moleculares e ajudaria no direcionamento de um tratamento mais personalizado e individualizado.
Na época, o teste genômico no tumor não era realizado no Brasil. Fiz a coleta de sangue e o material foi enviado para um laboratório nos Estados Unidos para análise. O resultado mostrou uma alteração genética rara. A partir disso, os médicos escolheram como terapia-alvo a imunoterapia —um tipo de tratamento que visa combater o avanço do tumor pela estimulação do próprio sistema imunológico do paciente.
Fiz dez aplicações de imunoterapia durante oito meses. Quando iniciei o tratamento, o nível do PSA estava alto, em 23, e foi baixando gradativamente até zerar. O resultado foi maravilhoso, o único problema foi que investi cerca de R$ 300 mil por sete aplicações, as outras três consegui pelo convênio por meio de uma ação judicial, bem como o pedido de reembolso do valor investido. Em 2018, a imunoterapia ainda não era oferecida no SUS para o tratamento contra nenhum tipo de câncer.
Entre períodos de remissão e recidiva, a luta contra o câncer já durava 13 anos, mas graças ao teste genômico no tumor, os médicos conseguiram descobrir o tratamento mais indicado e eficaz para o meu caso.
A imunoterapia salvou a minha vida e me curou de um câncer metastático. Já faz quatro anos que estou livre da doença e me sinto muito bem."
1) O que é e para que serve o teste genômico no tumor?
Ele tem duas finalidades principais: a primeira é buscar alterações moleculares que possam dar evidências do comportamento biológico, ou seja, mostrar se há alguma alteração genética que faça com que o tumor desperte mais facilmente a resposta imunológica do paciente. A segunda é buscar alterações que possam direcionar para terapia-alvo disponível visando um tratamento individualizado.
Por meio do teste ainda é possível encontrar alterações que levantem a suspeita de que o paciente pode ter uma síndrome de câncer familiar. Uma vez confirmada a mutação genética hereditária, a indicação é testar toda a família. É o conceito de medicina preditiva, preventiva e personalizada da qual faz parte a genômica.
2) O teste pode ser feito em que tipo de tumor?
O teste genômico pode ser feito em qualquer tumor sólido ou em doenças onco-hematológicas. No caso de tumores sólidos, ele pode ser realizado no fragmento do tumor ou por meio de biópsia líquida, quando o teste é realizado pelo sangue do paciente.
3) Qual a contribuição da genética nos casos de câncer de próstata?
Nos casos de câncer de próstata é possível buscar marcadores que estão associados à resistência à terapia endócrina, que é o bloqueio hormonal usado para diminuir o crescimento do tumor. Também há marcadores associados a defeitos de recombinação homóloga —que é a incapacidade de restauração do DNA de maneira perfeita, tendo como consequência o aparecimento de alguns tumores— que podem ser tratados com uma classe de drogas.
4) Que tipo de alteração foi descoberta no teste genômico realizado pelo Mário?
Por meio do teste genômico, descobrimos que o Mário tinha instabilidade de microssatélites, isto é, uma alteração genética rara em que a célula perde a capacidade de corrigir erros do DNA. A consequência disso é a enorme quantidade de mutações novas que geram proteínas novas. Essas proteínas novas são estranhas ao organismo e provocam uma resposta imunológica contra o tumor. Trata-se de uma condição rara em câncer de próstata, mas que não pode ser desconhecida do oncologista.
A partir do resultado do teste, indicamos como terapia-alvo a imunoterapia, pois ela acentua a resposta imunológica do corpo do paciente e combate os tumores. Vale ressaltar que o teste genômico só é realizado nos casos de câncer de próstata quando a doença está avançada, é metastática, agressiva e refratária ao tratamento. Isso porque 70% dos tumores iniciais de próstata são tratados e curados com cirurgia, sem precisar fazer quimioterapia. A quimioterapia só é indicada quando a doença se dissemina.
5) Como foi possível o Mário ser curado de um câncer metastático?
O câncer estava metastático dentro da cavidade do abdome. A cura foi possível porque o tratamento ativou o sistema imunológico do Mario pela ação da imunoterapia em todo o organismo --são células imunológicas que circulam pelo organismo e atacam focos de metástase onde quer que eles estejam.
Vale dizer que qualquer câncer com a instabilidade de microssatélites, independentemente do órgão atingido, pode ser curado com imunoterapia.
Fontes: Cristovam Scapulatempo Neto, diretor médico de patologia e genética da Dasa Genômica;
e Carlos Dzik, diretor de oncologia do Hospital Nove de Julho e diretor da Regional São Paulo da Dasa Oncologia e médico do Mário.
Após 13 anos de luta, teste genético ajudou ele a tratar câncer de próstata - VivaBem
Read More
No comments:
Post a Comment