Os casos de hepatite misteriosa aguda sem origem conhecida deixaram a comunidade médica em alerta desde abril. As primeiras ocorrências surgiram no Reino Unido e, depois, se espalharam pelo mundo. Durante a XXIV Jornada Nacional de Imunizações da SBIm, que ocorreu em São Paulo entre os dias 7 e 10 de setembro, Melina Utz Melere, gastroenterologista pediátrica do Hospital da Criança Santo Antônio (RS), participou da conferência: "O que sabemos sobre a hepatite misteriosa?" e explicou como a doença se desenvolve e quais são os seus principais sintomas.
De acordo com a médica, a hepatite aguda é classificada como um excesso inflamatório do corpo em decorrência de uma resposta imunológica a um agente agressor. Quando ocorre esse processo inflamatório, há a destruição dos hepatócitos [células do fígado]. Geralmente, esse quadro é provocado por vírus conhecidos como hepatotrópico dos tipos A, B, C, D e E. "Mais de 90% dos casos são devido a esses vírus hepatotróficos", explica a gastroenterologista, acrescentando que a hepatite pode ser causada por outros vírus e até mesmo por doenças autoimunes.
Mesmo quando os hepatócitos são destruídos, o fígado consegue se regenerar e o paciente volta a ter um quadro normal em uma ou duas semanas, ficando, muitas vezes, assintomático. Já no caso de insuficiência hepática aguda, a situação diferente. "Não só os hepatócitos foram machucados, mas sim a síntese hepática, isto é, aquilo que o fígado consegue produzir", pontua a pesquisadora.
Casos de origem desconhecida
Melina explica que os casos de hepatite severa em criança surgiram em abril quando crianças começaram a chegar aos hospitais com icterícia. "Começou-se a se olhar um pouco para trás e percebeu-se que desde outubro de 2021, nos hospitais do Alabama (EUA), cinco casos de hepatite já tinham sido notificados e que eles tinham encontrado o adenovírus como um potencial agente causador. Em março de 2022, a Europa comunicou 13 crianças com esse mesmo diagnóstico e, a partir de abril, a Organização Mundial da Saúde (OMS) comunicou 169 casos em 12 países", lembra a gastroenterologista.
Os pacientes com esse tipo de quadro desenvolviam sintomas como: dor abdominal, vômitos, diarreia e icterícia e tinham entre 3 a 4 anos. Existem algumas hipóteses sobre o que estaria por trás desses casos. Durante a sua apresentação, a médica do Hospital da Criança Santo Antônio (RS) comentou que uma das hipóteses iniciais era que a persistência viral do SARS-CoV-2 no trato gastrointestinal desencadearia uma inflamação e uma injúria hepática.
Outra hipótese está relacionada com o lockdown: "Essas crianças praticamente nasceram no momento da pandemia, então, não tiveram contato com a escola e outras crianças. Assim, pensamos: 'o que aconteceu com o sistema imunológico dessas crianças na pandemia?'. Será que está mais imunodepremido por causa desse afastamento. A falta de exposição ao adenovírus e outras doenças virais poderia levar a uma resposta desregulada à primeira infecção pelo adenovírus humano", sugere a gastroenterologista.
Para classificar um paciente com hepatite misteriosa, a especialista cita que a OMS tem alguns critérios: é preciso descartar todas as outras hepatites dos vírus hepatrócitos, a criança tem que ter de um mês até 16 anos e ter tido desenvolvido os sintomas a partir de outubro de 2021, além de não ter nenhuma doença hepática prévia.
No Brasil, além dos critérios da OMS, considera-se os casos notificados desde abril e se exclui as manifestações clínicas como doenças metabólicas, hereditárias, genéticas, congênitas, obstrutivas, além das arboviroses, como: dengue, chikungunya, febre amarela e zika.
No evento, Melina também destacou que no mundo, até 12 de julho, foram relatados 1.010 casos de hepatite aguda grave de etiologia a esclarecer em 35 países, sendo 75% em menores de 5 anos. Em nota enviada à CRESCER, o Ministério da Saúde informou que monitora os casos de hepatite aguda grave sem origem conhecida e divulga, quinzenalmente, informe sobre os casos rastreados no país. Os dados mais recentes, divulgados em 13 de setembro, apontam 38 casos em investigação, 28 descartados, 7 prováveis e 38 inconclusivos.
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Hepatite misteriosa: quais são os principais sintomas nas crianças - Crescer
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