Três médicos que ajudaram na elaboração de dossiê entregue à CPI da Covid, com denúncias contra a operadora de saúde Prevent Senior, suspeita de fraudar atestados de óbito e omitir a covid-19 como causa da morte de pacientes, mostraram o rosto pela primeira vez durante entrevista ao "Fantástico", da TV Globo, exibida na noite de hoje.
Andressa Joppert, George Joppert e Walter Corrêa, demitidos pela operadora entre agosto do ano passado e fevereiro deste ano, reafirmaram as denúncias sobre pressão para prescrição de medicamentos do chamado "kit covid" —como hidroxicloroquina, que não tem eficácia comprovada contra a covid-19— e revelaram a meta estipulada pela Prevent Senior para que os médicos atendessem 60 pacientes em 12 horas. Eles também rebateram a acusação feita por um dos diretores da empresa, Pedro Batista Jr., sobre a suposta manipulação de dados de uma planilha e invasão de sistema.
A forma vil, a forma de nos chamar de criminosos... Nós não somos criminosos. Nós não invadimos nada. George Joppert, médico que trabalhava na Prevent Senior, em entrevista ao "Fantástico"
A Prevent Senior, que já é alvo de investigações no Ministério Público, na Polícia Civil e na CPI da Covid, é acusada de supostamente pressionar seus médicos conveniados a tratar pacientes com substâncias do "kit covid".
A empresa também é suspeita de ter conduzido um estudo sobre a hidroxicloroquina no tratamento da doença sem avisar pacientes nem seus parentes. Tal estudo teria omitido mortes de pacientes, influenciando o resultado para dar a impressão de que o medicamento seria eficaz.
Entregava o kit [covid] que já ficava pronto no consultório. Era tudo controlado. Ficava um balde com um monte de saquinhos. Era meio constrangedor, às vezes, entregar as receitas com kits, mas orientava: 'olha, a gente tem que prescrever. Então você só usa as vitaminas. Não usa a medicação'. Eles estavam de olho em que prescrevia ou não. Era uma coisa que se tinha controle. Então não havia essa autonomia. Walter Corrêa sobre a pressão para prescrição do "kit covid"
Durante a entrevista, os médicos revelaram ainda meta estipulada pela direção da Prevent Senior, para que os médicos atendessem a 60 pacientes em doze horas —o que equivale a um paciente a cada doze minutos.
Infelizmente, eles têm essa política, mas a gente [médicos] sempre tentou fazer com a parte da ética. Eu mesma, por várias vezes, levei bronca por não cumprir a meta. Andressa Juppert revela meta para atendimento de pacientes na Prevent Senior
Os médicos afirmaram ter decidido se expor para denunciar práticas que consideram ilegais, e dizem viver uma rotina de medo e apreensão depois que o nome deles foi divulgado pela própria empresa.
Empresa nega acusações
Em nota, a Prevent Senior nega as acusações feitas pelos médicos e diz que "investigações técnicas esclarecerão os fatos com o devido tempo". A empresa diz ainda que "jamais adotou protocolos para redução de custos".
Veja na íntegra a resposta da empresa à acusação feita pelos médicos:
A Prevent Senior refuta mais uma vez as acusações, montadas a partir da manipulação de mensagens por 3 médicos demitidos da empresa por condutas irregulares, dentre elas casos de mau atendimento a pacientes que resultaram em boletins de ocorrência, além dos crimes de violação de prontuário médico. A Prevent avalia que investigações técnicas esclarecerão os fatos com o devido tempo para avaliação de provas, direito ao contraditório e ampla defesa. A Prevent prioriza tanto a autonomia e confiança do médico que os acusadores prescreveram para si mesmos e seus familiares Hidroxicloroquina, o que demonstra que estão mentindo e forjando acusações.
A Prevent Senior jamais adotou protocolos para redução de custos. Pelo contrário, investiu R$ 250 milhões durante a pandemia na aquisição de equipamentos, contratação de profissionais e um programa de testagem em massa que atendeu mais de 500 mil beneficiários, com milhares de vidas salvas. Sobre a paciente em questão, lamenta-se, mais uma vez, a violação do sigilo médico. Pode-se dizer, entretanto, que ela recebeu os tratamentos adequados, foi acompanhada pelos cardiologistas da empresa e encontra-se em bom estado de saúde.
O médico Pedro Batista Júnior refuta a suposta ameaça. Diz se tratar de uma conversa entre até então dois amigos em que ele alertava para a má-conduta da violação do prontuário de um paciente. Estranhamente, a suposta ameaça somente foi registrada na Polícia Civil mais de dois meses depois da data da conversa, em 9 de abril. Dr. Pedro processará o médico Walter Correa por denunciação caluniosa.
Outras acusações
Diante das acusações que vieram à tona nos últimos dias, a empresa vem argumentando que não havia orientação direta para uso da hidroxicloroquina ou cloroquina porque os médicos são livres para prescrever o medicamento que julgarem mais adequado para cada paciente.
A empresa também nega que tenha adulterado qualquer estudo clínico. Há suspeita de que pacientes que morreram em decorrência da covid tiveram seus atestados de óbito emitidos sem referência à doença causada pelo coronavírus, como a mãe do empresário Luciano Hang, apoiador do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
Dossiê, denúncias e escândalo
O procurador-geral de Justiça, Mario Sarrubbo, anunciou a criação de uma espécie de força-tarefa —composta pelos promotores Everton Zanella, Fernando Pereira, Nelson dos Santos Pereira Júnior e Neudival Mascarenhas Filho— para investigar as denúncias contra a Prevent Senior.
Na semana passada, a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) também autuou a operadora de saúde após identificar elementos que, segundo ela, contradizem a versão inicial apresentada pela empresa.
Segundo a ANS explicou ao UOL, a Prevent Senior deixou de informar aos pacientes que eles estavam recebendo medicamentos do "kit covid". A operadora tem 10 dias contados a partir da autuação para apresentar sua defesa à agência que regula os serviços de planos de saúde no Brasil.
Se confirmada a infração e a Prevent Senior for condenada, a multa poderia chegar a R$ 25 mil por paciente (não foi informado o número total), de acordo com a agência; porém, como se trata de um dano coletivo, seria aplicado um multiplicador ao montante final.
Médicos da Prevent Senior mostram o rosto e dizem que não são criminosos - UOL Notícias
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